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Publicidade e educação

NELSON PRETTO é diretor da Faculdade de Educação da Ufba – www.pretto.info

Nas grandes cidades, somos insistentemente inundados com as imagens da publicidade. Entretanto, no nosso cotidiano tão corrido, muitas vezes, as coisas acontecem em nossa volta e nem nos damos conta. Não sei se o leitor se lembra, mas, no final de 2004, os outdoors de Salvador ganharam vida e espalharam-se agressivamente pelos passeios e no meio dos canteiros, já tão pequenos. A sensação é a de que ninguém percebeu ou, o que é pior, já considera isso tudo muito natural!

No ano passado, os publicitários descobriram uma nova forma de espalhar na cidade mais imagens que vão além das áreas dos outdoors já instalados em (todas!) as nossas vias. São casinhas que crescem e se duplicam, homenzinhos que, de tão poderosos, saem fora dos espaços a eles reservados, carros que, de tão velozes, passam de um painel para outro, num piscar de olhos.

Não falta imaginação nessa agressiva inundação de imagens que divulga produtos, serviços e, principalmente, marcas, de todos os tipos. Ainda que esses centímetros quadrados a mais estejam sendo pagos à prefeitura – o que não sei se ocorre! –, precisamos estar mais atentos, pois nosso universo imagético não suporta mais tanta pressão.

Nos grandes centros, do Brasil e do mundo, discute-se intensamente o uso das laterais “cegas” de edifícios – aquelas paredes imensas sem janelas – para mais publicidade. Recentemente, uma polêmica tomou conta do Rio e de São Paulo, em face das dimensões monumentais dessas propagandas, com figuras gigantescas – modelos e objetos – surgindo em nossa paisagem de forma tão brutal. Ainda não chegamos a isso em Salvador, mas, se tais manifestações da publicidade forem facilmente assimiladas, sem maiores questionamentos, pode ser muito tarde.

Vivemos neste mundo de marcas e logomarcas que ocupam todos os espaços físicos, bem assim nosso imaginário. Como não poderia deixar de ser, nestes tempos em que a educação é cada vez mais confundida com mercadoria, existem também – e não são poucos! – os outdoors de escolas, faculdades e universidades que oferecem a garantia de um futuro de sucesso através da venda das suas “qualidades”: emoção, tecnologias, acesso ao mercado de trabalho sem fila, posição de destaque na sociedade, empreendedorismo, entre outras.

O sistema privado de educação em nosso Estado – que em nada difere do restante deste Brasil tomado pelas privatizações generalizadas – cresceu e cresce de forma tão descontrolada que demanda mais e mais clientes. Sim, caro leitor, falamos agora em clientes, pois os alunos do sistema educacional privado nada mais são do que clientes que precisam ser “fisgados” por uma dessas instituições.

Os últimos dados da educação superior em nosso Estado indicavam que, em Salvador, de 1991 a 2003, o número de cursos de graduação cresceu de 81 para 249, sendo que destes 68% em instituições privadas. No Estado, a mesma coisa: a graduação cresceu quase 400%, sendo mais da metade em instituições privadas. Crescimento de cursos de graduação, para muitos, é sinônimo de novas oportunidades de trabalho, mas esta não é uma equação de simples solução.

No entanto, o que fica evidente é que esse parece ser um grande negócio. Num país em que, nas últimas décadas, pouco se investiu para a expansão do sistema público, restou às famílias a opção do ensino privado, que, inclusive, foi estimulada como de resto vinha ocorrendo desde o ensino básico. Ocorre que tal expansão do ensino privado resultou, para o caso de Salvador, na existência de mais vagas do que candidatos, o que, por sua vez, exigiu intensa mobilização das empresas de publicidade a fim de que as “empresas de educação” pudessem preencher as suas vagas.

Nesse vale-tudo, a publicidade das faculdades e universidades se confunde com a dos aparelhos celulares ou dos blocos de carnaval. Todo ano, a coisa se repete. Novas linguagens são utilizadas, em alguns casos, inclusive, com trocadilhos absolutamente infames, e até com grafites em muros, para que você e sua família sejam convencidos de que em tal faculdade você terá garantia de um “grande futuro”.

Nada mais difícil do que escolher entre tantas opções que, em última instância, não diferem muito. Como temos insistido, a associação de educação com mercadoria não é nova e já tem apresentado problemas significativos. Portanto, atenção redobrada, porque o risco é você entrar num bloco de carnaval pensando estar na faculdade, ou vice-vers

Publicado em A Tarde - Opinião, 25/01/2006, pag. 02 -- NelsonPretto - 25 Jan 2006


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