Um quinto dos cientistas usa drogas para turbinar seu desempenho, diz pesquisa
A era do doping científico pode ter começado, a julgar pelos resultados de um levantamento feito pela revista especializada britânica "Nature". Um em cada cinco pesquisadores que responderam um questionário on-line da publicação admitiram o uso de drogas para melhorar seu desempenho intelectual. São medicamentos normalmente empregados contra doenças do sono, hiperatividade e problemas cardíacos, que agora estão sendo colocados a serviço da mente dos cientistas sem prescrição médica.
A "Nature" havia colocado o questionário em seu site no começo deste ano, estimulada por um artigo especulativo de neurocientistas da Universidade de Cambridge. Barbara Sahakian e Sharon Morein-Zamir haviam feito uma enquete de pequena escala com seus colegas a respeito do uso desse tipo de droga e perguntado se estariam dispostos a usar tais substâncias para melhorar seu desempenho. As reações do público da "Nature" foram tão fortes que a revista se viu motivada a realizar sua própria pesquisa.
O questionário foi respondido por 1.400 pessoas de 60 países. Além de perguntas mais genéricas sobre as opiniões pessoais dos cientistas a respeito do uso de "doping", a revista decidiu enfocar um trio de substâncias já conhecidas por seu uso entre estudantes desesperados.
A tríade abrange o Ritalin (princípio ativo: metilfenidato), normalmente usado para tratar hiperatividade ou distúrbio do déficit de atenção e empregado informalmente; o Provigil (modafinil), que atua contra problemas de sono mas também combate o cansaço e a desregulação do relógio biólogico; e os chamados betabloqueadores, que os médicos recomendam contra arritmia cardíaca, embora tais drogas também possam atuar contra a ansiedade.
Para todas as idades
Entre as descobertas do levantamento, uma das mais surpreendentes é que o uso de drogas não variou com a idade dos cientistas: proporções relativamente semelhantes deles admitiram a prática em grupos etários tão distintos quanto "menos de 25 anos" e "entre 55 e 65 anos". A maioria também afirmou ter usado as substâncias ao menos uma vez por mês, e metade disse ter experimentado efeitos colaterais desagradáveis do uso.
As drogas do tipo Ritalin/metilfenidato parecem ser as mais populares, tendo sido utilizadas por 62% do grupo, na frente do modafinil (44%) e dos betabloqueadores. Isso explica porque a principal justificativa para o uso de "doping" citada pelos participantes da pesquisa foi o desejo de melhorar a concentração.
O elemento mais interessante da pesquisa talvez seja a análise subjetiva do significado dessa prática feita pelos participantes. Quatro quintos dos cientistas que responderam a pesquisa dizem achar que todo adulto deveria ter direito a usar o "doping intelectual" se tivesse vontade, mesmo sem problemas mentais específicos. Quase 90% deles afirmam que o acesso a tais drogas não deveria incluir crianças e adolescentes. E se os filhos deles estudassem em escolas onde outras crianças fazem uso desse "doping"? Nesse caso, um terço dos entrevistados disse que se sentiria pressionado a dar tais substâncias a seus filhos.
"Como profissional, é meu dever usar meus recursos para o maior benefício possível da humanidade. Se os 'melhoradores' podem contribuir para que eu realize esse serviço humanitário, é meu dever tomar essa atitude", declarou um dos participantes da pesquisa, um cientista com mais de 65 anos de idade que vive nos Estados Unidos.