Psiquiatras discutem IV Conferência Estadual de Saúde Mental
por Paula Boaventura em
Psiquiatras baianos reuniram-se no final de julho (27), na sede da Associação Bahiana de Medicina (ABM), para avaliar os resultados da IV Conferência Estadual de Saúde Mental Intersertorial da Bahia (IV CESMI-BA), que aconteceu no final de maio. A reunião científica, a quinta realizada este ano pela Associação Psiquiátrica Baiana (APB), obedeceu a resolução definida no VIII Fórum Nacional de Federadas da Associação Brasileira de Psiquiatria (ABP), em que foi recomendado que as diretorias regionais avaliassem as conferências locais junto a seus associados, a fim de que a ABP possa posicionar-se frente aos eixos definidos pelo Conselho Nacional de Saúde para as conferências.
O coordenador da área técnica de saúde mental na SESAB, Iordan Gurgel, fez a palestra inicial na qual discorreu sobre a história das quatro edições da conferência e dos resultados obtidos a partir delas. o psiquiatra também apresentou os números da conferência estadual, da qual participaram 150 municípios baianos, através das propostas levantatadas ateriormente em 52 conferências municipais ou regionais. Ao todo, a Bahia enviou 322 propostas para a etapa nacional do evento e a participação da classe médica na IV CESMI-BA foi de 17 psiquiatras, entre delegados e convidados.
Outra estatística apresentada, desta vez pela consultora do Ministério da Saúde, Ana Pitta, foi a evolução no número de centros de atenção psicossocial (CAPS) no estado. De 15 centros existentes em 2002, a Bahia registra atualmente 170 CAPS, de acordo com os dados da psiquiatra. Para ela, a psiquiatria baiana foi importante para a conscientização da classe a nível nacional quanto a necessidade da inserção do médico no movimento da Reforma Psiquiátrica.
Gurgel acredita que a política de saúde mental conquistada pela Reforma Psiquiátrica se consolidou sobretudo pela melhora na assistência. "Existem muitos avanços com a reforma e é necessária a mobilização da classe médica para acompanhar e intervir no processo", diz.
E um dos pontos mais discutidos foi justamente o lugar do psiquiatra nos serviços substitutivos de saúde mental. A coordenadora de Saúde Mental de Salvador, Célia Rocha, criticou a idéia de que CAPS pode funcionar sem médico psiquiatra. Ela considera que, até certo ponto, as equipes multiprofissionais podem ser eficazes, mas em momentos de crise, por exemplo, o único profissional a ser requisitado pela equipe é o psiquiatra. "É preciso retornar lugar do psiquiatra, inserí-lo no processo da Reforma Psiquiátrica. Houveram discussões sobre a necessidade de médico no CAPS, mas a realidade não é essa", pontuou a coordenadora.
Outro problema levantado foi a questão da internação. Ana Pitta afirma que, a depender do quadro clínico, é indiscutível a necessidade de internação. De acordo com a Política Nacional de Saúde Mental, os leitos destinados a pacientes com transtorno psíquico, são os leitos integrais nos hospitais gerais. Célia Rocha afirma, no entanto, que, no estado, tal dispositivo é essencial e ainda não foi formalmente disponibilizado a este perfil de pacientes, ainda que se afirme que exista um total de 57 leitos. Além disso, ainda há muita resistência das equipes médicas dos hospitais gerais em aceitar os pacientes em crise. A médica lembrou que há momentos em que é necessário acionar o Ministério Público e que tal dificuldade se converte em sobrecarga para as equipes dos CAPS.
De acordo com o coordenador adjunto do Centro de Estudos e Terapia do Abuso de Drogas (CETAD), George Gusmão, a resistência não se limita apenas à oferta dos leitos integrais. Ele registrou a dificuldade em solicitar outros procedimentos aos hospitais, como exames clínicos, para os pacientes do centro. Para ele, tal postura dos serviços públicos para com os pacientes com transtornos psíquicos contradiz um dos príncipios do SUS, que é o do acesso universal aos serviços públicos de saúde. O médico também ressalou a importância de se melhorar a qualificação dos alunos de medicina e dos psiquiatras récem-formados dentro da lógica da Reforma Psiquitrica.
Retornando às propostas levantadas na conferência estadual, o diretor da APB, Eduardo Saback, criticou a tendência em responsabilizar a realidade social e cultural enquanto fonte causadora dos transtornos psíquicos. Este pensamento, para ele, coloca em cheque a eficácia dos serviços de saúde mental e coloca o profissional da rede de atenção de saúde mental no papel de agente de transformação social, o que não condiz com a real função do profissional.
O debate sobre o assunto deverá continuar em próxima reunião marcada pela APB, onde também foi sugerida a inclusão de um debate sobre tratamento para usuários de álcool e outras drogas.
fonte: CETAD Observa